A ex-prefeita Dárcy Vera, presa e acusada de corrupção na Operação Sevandija,
e o Instituto Corpore foram condenados pela segunda vez consecutiva
pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP) a devolver recursos públicos
por 27 irregularidades na terceirização de médicos na Unidade Básica de
Saúde Distrital (UBDS) Central de Ribeirão Preto (SP).
Os conselheiros apontaram problemas na prestação de contas do convênio
em 2012 avaliado em R$ 5,2 milhões e exigiram a devolução de R$ 1,89
milhão em gastos não comprovados. Resultante da mesma parceria, a
prestação referente a 2011 também foi rejeitada no ano passado, quando se exigiu a devolução de outro montante de R$ 1,29 milhão.
Além da parceria na saúde, o TCE reprovou cinco prestações de contas referentes às despesas gerais do município nos oito anos em que Dárcy comandou a Prefeitura.
A decisão mais recente relatou problemas nas movimentações financeiras,
falta de comprovação de gastos e mostras de que o convênio com o
Corpore foi mais vantajoso do que a contratação direta de servidores.
"A prestação de contas demonstra que os repasses não obedeceram ao
mínimo de transparência que se exige no uso de recursos públicos,
especialmente em se tratando de repasses diretos para aplicação na
realização do direito fundamental da saúde", expediu o relator Dimas
Ramalho.
O atual prefeito, Duarte Nogueira (PSDB), também deve apresentar ao TCE
que medidas têm tomado para sanar os danos aos cofres públicos. Ainda
há prazo para recursos.
A Secretaria Municipal de Negócios Jurídicos da Prefeitura comunicou que ainda não foi notificada a respeito da decisão. O G1 não
conseguiu localizar o advogado de defesa de Dárcy que responde por essa
rejeição. Procurada pela reportagem, a advogada Maria Cláudia Seixas,
que defende a ex-prefeita em processos como o da Operação Sevandija,
disse que não cuida desse caso.
Também procurados, os advogados do Instituto Corpore não se posicionaram sobre a reprovação na quarta-feira (21).
As avaliações de outras três prestações do termo de parceria, entre
2013 e 2015, quando o convênio foi encerrado, ainda estão pendentes.
Uma ação ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho em 2017 pediu o fim da terceirização em todas as unidades de saúde da
cidade depois de um inquérito apontar irregularidades na prática,
observada em locais como a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da
Avenida Treze de Maio, unidades básicas (UBSs) e distritais (UBDSs).
A Justiça do Trabalho negou a liminar pelo afastamento imediato dos
terceirizados e uma audiência foi marcada para julho de 2018.
Em contrapartida, a Prefeitura tentou emplacar um projeto para regulamentar a prática, por meio da contratação de organizações sociais, a fim de inaugurar uma UPA no bairro Sumarezinho,
mas a iniciativa foi rejeitada pela Comissão Permanente de Justiça e
Redação na Câmara. O Executivo entrou com um recurso, que acabou
rejeitado pelos vereadores na terça-feira (20).
27 irregularidades
A rejeição foi confirmada por unanimidade pela 2ª Câmara do Tribunal de
Contas na terça-feira (20). Os conselheiros concordaram com os
apontamentos do relator Dimas Ramalho, que julgou procedentes as 27
irregularidades apontadas pelos fiscais nas movimentações financeiras,
na documentação e na execução do convênio.
De acordo com o TCE, a Prefeitura e o Instituto Corpore não conseguiram
comprovar que a parceria foi mais vantajosa aos cofres públicos do que a
colocação direta de servidores na UBDS, bem como gastos da ordem de R$
1,89 milhão.
"Os documentos encaminhados não serviram para comprovar com
transparência as despesas realizadas com refeições, no valor de R$
20.656,61", complementa o relator.
Além disso, a administração e o instituto documentaram o total dos
repasses previstos no convênio em valores diferentes. "Enquanto a
Prefeitura registra repasse de R$5.223.821,47, a OSCIP dispõem em seus
registros o repasse de R$5.419.345,1", registra.
O tribunal também apontou problemas nos documentos apresentados, como
nos demonstrativos de receitas e despesas. Segundo o TCE, o saldo
apurado ná aplicado foi de R$ 29 mil, quando o constante nos extratos no
final do ano em questão foi de R$ 236,2 mil.
As horas trabalhadas referentes aos pagamentos da ordem de R$ 11,2 mil também não foram comprovadas.
"A movimentação dos recursos para fazer frente às despesas do exercício
de 2012 em conta específica ficou prejudicada na medida em que houve
transferências entre outras contas da Entidade", citou o relatório.
Além da devolução de R$ 1,89 milhão, que deve virar um título de
execução fiscal dentro da Prefeitura e ainda será corrigido, os
conselheiros definiram o pagamento de multa de 300 unidades fiscais do
Estado de São Paulo (Ufesps) - equivalente a R$ 7,7 mil - à ex-prefeita e
à presidente do instituto, Crys Angélica Ulrich.
Além disso, a organização social está proibida de receber qualquer recurso público até a regularização do problema apontado.
Suspensão de processos
Acusada de chefiar um esquema que desviou R$ 45 milhões dos cofres
públicos por meio do pagamento indevido de honorários advocatícios,
Dárcy está presa desde maio de 2017, quando o Superior Tribunal de
Justiça cassou uma liminar que a mantinha em liberdade provisória.
No início deste ano, ela entrou com um pedido pela suspensão de todos os processos que tramitam no TCE-SP.
O Tribunal registra 28 ações em julgamento em que Dárcy aparece como
“ordenadora de despesas”, ou seja, era responsável pelas contas, sem
contar outros processos em que a ex-prefeita figure apenas como
“representante da Prefeitura”.
Durante os oito anos em que esteve à frente da Prefeitura, Dárcy teve
cinco prestações de contas reprovadas pelo TCE-SP. Apenas em 2009 e
2011, os conselheiros deram pareceres favoráveis. As contas de 2016
ainda não foram julgadas e as a 2015 encontram-se em fase de recurso.
Os balanços de 2012 e 2013 foram reprovados pela Câmara Municipal, que ainda deve votar os pareceres contrários referentes a 2014 e 2015. O Legislativo, entretanto, já aprovou balanço orçamentário de 2010, na contramão do que havia decidido o TCE-SP.
Na época, o então presidente da Casa, o ex-vereador Cícero Gomes, que também é réu na Operação Sevandija, disse que as irregularidades apontadas pelo Tribunal eram “formais”, enquanto a decisão dos vereadores foi baseada em questões políticas.
Por G1 Ribeirão e Franca