Foto: Antônio Diniz Garis em Boa Vista correm cerca de 10 quilômetros por dia e carregam 330 toneladas a cada jornada de trabalho |
“Já é comum a gente escutar: ‘lá vem o carro da Avon [empresa de cosméticos]’. A população precisa respeitar mais nossa profissão, pois imagina se não existisse o gari? Acho que é uma questão de educação”, comentou um gari, ontem pela manhã. Ele preferiu não se identificar alegando que seria novamente alvo de chacotas na rua onde mora, no bairro Santa Luzia, zona Oeste.
O trabalho dos garis é penoso, uma verdadeira maratona. Eles começam antes de o sol raiar, correm mais de 10 quilômetros por dia e carregam uma média de 330 toneladas a cada jornada de trabalho. “Tem que ter fôlego, meu irmão. Se não pede para sair”, disse o gari, sorrindo.
Mas, apesar da árdua missão, eles lamentam não pelo forte odor do caminhão de lixo, mas do preconceito e discriminação que sofrem nas ruas da cidade. “Como disse, as pessoas riem quando a gente fala que é gari. Alguns, com nojo, até evitam tocar na nossa mão, sem falar nos apelidos maldosos que ganhamos todos os dias”, complementou.
Na rua onde mora, o gari também não escapa do preconceito. Disse que perdeu até a namorada de tanto as colegas a perturbarem. “Pode acreditar. Ela me deixou por causa da minha profissão. Lá na rua, só para você fazer ideia, meu apelido é ‘Cheiroso’. Quando chego junto dos amigos é aquela curtição. Se bate um fedor, a moçada logo olha para mim e ri. Dizem que sou eu que estou fedorento, então me mandam banhar”.
Contudo, o preconceito e a discriminação não o fazem desistir na vida. Cursando o EJA (Educação de Jovens e Adultos) à noite, ele garante que um dia será doutor. “Mas, se não der, eu pelo menos quero ser o motorista do caminhão do lixo”, brincou.
Entre as maiores dificuldades enfrentadas no dia a dia, além de ter que suportar o mau cheiro, o gari reclama do tratamento dado ao lixo doméstico na Capital. “Se a população guardasse o lixo em sacos fechados e colocasse para fora, nas lixeiras, apenas nos dias de coleta, com certeza isso iria nos ajudar muito. Temos muita dificuldade na hora de juntar o lixo”.
Sobre a coleta seletiva do lixo doméstico, o gari também lamentou que Boa Vista ainda não dispõe do serviço. “Existe lugar com lixeiras que separam o lixo, principalmente em órgão públicos federais, mas não adianta porque os carros coletores não estão preparados para isso. A gente pega e vai jogando tudo dentro. E somente lá na lixeira pública que os catadores separam e vendem o material reciclável”, relatou.
AMILCAR JÚNIOR