Foto: Valter Campanato / Agência Bra
Voto do relator Luís Roberto Barroso foi
acompanhado com atenção por dezenas de indígenas, que foram ao SFT
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Apesar dos ministros Marco Aurélio e Joaquim Barbosa terem sido contra as condicionantes, por entenderem que o STF (Supremo Tribunal Federal) não poderia ter criado as regras para a reserva, consideradas abstratas e alheias ao que foi proposto na ação, tendo o tribunal agido como legislador, eles foram voto vencido. Por maioria, a Corte decidiu manter a decisão de 2009, confirmando as 19 condicionantes que foram estabelecidas no processo sobre a demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol.
Com sete recursos com pedidos de esclarecimento e de revisão do acórdão de 2009, o STF apenas elucidou alguns pontos, mantendo a decisão do caso que, conforme a sessão de ontem, não deverá ser vinculado por juízes e tribunais, quando do exame de outras causas relativas a outras terras indígenas.
Tendo a maioria dos ministros seguido o voto do relator, Luís Roberto Barroso, ficou esclarecido que, além de os indígenas não poderem exercer poder de polícia, nem inviabilizar a passagem de não índios nas rodovias que cortam a reserva, as atividades de extrativismo mineral, como para a produção de brincos e colares, que não tenham objetivo econômico, poderão ser realizadas na Terra Indígena. Caso o objetivo seja o de obter lucro, haverá a necessidade de autorização da União, como determinado em uma das condicionantes anteriormente, pois, conforme o relator, o extrativismo não deve ser confundido com mineração ou garimpo.
O Plenário esclareceu ainda que pessoas miscigenadas ou não índios que vivam maritalmente com indígenas podem permanecer na Raposa Serra do Sol, cabendo à comunidade decidir sobre a permanência de missionários e autoridades religiosas na reserva, assim como templos não indígenas. As escolas estaduais e municipais instaladas na área da reserva também devem continuar funcionando, desde que respeitem normas federais sobre educação de índios.
Quanto às ações individuais de portadores de títulos de propriedade de terras na região, o relator lembrou que, no julgamento da Petição 3388, em 2009, o STF não as apreciou, apenas julgou a validade da portaria e do decreto que homologaram a demarcação da Raposa Serra do Sol. Assim, ações individuais devem ser analisadas caso a caso, pelas instâncias locais, levando em conta o teor do julgamento. E destacou que eventuais conflitos entre grupos indígenas quanto à ocupação ou desocupação de fazendas deverão ser resolvidas pela própria comunidade, sob supervisão da União e da Funai (Fundação Nacional do Índio).
No fim do julgamento, o relator disse que recebeu informação do desembargador federal Jirair Megherian, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que auxiliou o relator original, ministro Ayres Britto, de que a execução da decisão já foi integralmente concluída. Segundo as informações do desembargador, em junho de 2009 não havia nenhum não índio na terra indígena Raposa Serra do Sol. Além disso, não houve necessidade de prisão e a maior parte dos não índios que tiveram que sair já sacou as indenizações depositadas pela Funai pelas benfeitorias da ocupação de boa-fé.
Assim, concluída a execução, o ministro Barroso propôs que, transitada em julgado essa decisão, a jurisdição do STF está encerrada no caso. A proposta foi acolhida pelos ministros presentes no final da sessão desta quarta.
FAZENDA - Autor da Petição, o ex-senador Augusto Affonso Botelho Neto foi um dos que recorreu contra a decisão, alegando que a Fazenda Guanabara deveria ser excluída da área demarcada, já que seria propriedade privada desde 1918, tendo sido reconhecido o domínio particular por sentença transitada em julgado em 1983. O ministro negou provimento aos embargos, lembrando que a questão da fazenda foi expressamente mencionada nos votos dos ministros Ayres Britto (aposentado), Menezes Direito (falecido) e Gilmar Mendes, na época do julgamento.
O deputado federal Paulo Cesar Quartiero (DEM), que acompanhou o julgamento em Brasília (DF), disse que não se surpreendeu com o resultado, apesar de ter acreditado que o Supremo decidiria em favor dos indígenas, revisando as condicionantes impostas em 2009. “O Supremo ficou em cima do muro. Foi um julgamento bem diferente do que foi o da Raposa, mas não era o que queríamos. Nosso objetivo era a anulação do resultado de 2009, já que os produtores que viviam na região, não tiveram direito à defesa e foram simplesmente retirados de lá”, reclamou o parlamentar, comentando sobre a possibilidade de recorrer aos tribunais internacionais, pela garantia dos direitos que foram retirados da Raposa.
ESTADO – Quanto ao recurso do Governo do Estado, que questionava o fato de o STF não ter estabelecido como seria a atuação do Estado na reserva Raposa Serra do Sol em relação aos serviços públicos como saúde e educação, o ministro relator, Luís Roberto Barroso explicou que, após a instrução do processo, o Estado pleiteou o ingresso no feito como litisconsorte, ao lado do autor, mas os ministros decidiram admitir o Estado como assistente simples, colhendo o processo na situação em que se encontrava.
SHENEVILLE ARAÚJO